Se há algo que caracteriza a era moderna, é a ampla velocidade na disseminação das informações. O elevado volume de dados atualmente existente, nos traz a capacidade de mapear, analisar e interpretar dados geoespaciais de maneira eficiente e precisa.
Nesse domínio, a tecnologia de Sistemas de Informação Geográfica (GIS) emerge como uma ferramenta essencial, conectando o mundo físico ao virtual.
A melhor forma de entendermos o impacto de uma nova tecnologia e suas utilidades socioeconômicas é pelo conhecimento de sua história. Ao compreendermos as necessidades humanas que levaram ao seu desenvolvimento, podemos também entender melhor os motivos que desencadearam a sua evolução, permitindo realizarmos projeções sobre o futuro desta tecnologia.
Desta forma, expomos aqui um breve debate sobre a fascinante história da tecnologia GIS, explorando suas raízes, evolução e impactos na sociedade.
Era pré-computacional: os primórdios da análise geoespacial
No século XIX, uma mortal epidemia de cólera assolou a cidade de Londres, espalhando pânico generalizado na população. Enquanto a doença se alastrava, o médico britânico John Snow, desenvolveu um método inovador de análise das zonas mais sujeitas à contaminação. Suas descobertas pioneiras não apenas alteraram o curso da saúde pública, mas também lançaram as bases para o que hoje conhecemos como Sistemas de Informação Geográfica (GIS).
O precursor do GIS
No ano de 1854, Londres era o epicentro de uma das mais devastadoras epidemias de cólera da história. O consenso predominante atribuía a propagação da doença a miasmas, ou ao “ar ruim”. No entanto, John Snow, desafiando essa teoria, inseriu-se nos bairros mais afetados para coletar dados, analisou-os meticulosamente e fez uma descoberta que mudaria para sempre a maneira como compreendemos as doenças transmitidas pela água.
Snow pontuou todos os casos registrados de cólera no entorno do bairro londrino de Soho em um mapa, destacando a concentração dos casos ao redor de uma bomba de água específica. Este gesto aparentemente simples foi o precursor do que hoje chamamos de análise geoespacial. O mapeamento permitiu a Snow inferir a conexão espacial entre os casos de cólera, apontando diretamente para a fonte contaminada de água, elucidando questões relacionadas à origem do problema.
O legado de John Snow
O trabalho que John Snow fez em Londres no século XIX ecoa até os dias atuais. Seu método de mapeamento e análise dos padrões de doenças não apenas salvou vidas na época, mas também estabeleceu as bases para o que agora é uma ferramenta essencial em diversas áreas do conhecimento: os Sistemas de Informação Geográfica.
O GIS moderno deriva diretamente da abordagem visionária de John Snow. Assim como ele mapeou manualmente os casos de cólera em um mapa, hoje o GIS utiliza tecnologia avançada para integrar múltiplos dados geográficos e fornecer insights poderosos aos usuários do sistema. A capacidade de se obter sobreposição de camadas de informação em um determinado espaço geográfico permite a compreensão holística de problemas complexos, desde o planejamento urbano até a melhoria de processos industriais e a gestão mais eficiente dos recursos naturais.
O Nascimento do Mapeamento Computacional
A história do GIS moderno remonta ao surgimento dos primeiros computadores na década de 1960. Nesse contexto, o geógrafo britânico Roger Tomlinson é reconhecido como pioneiro ao desenvolver o Sistema de Informação Geográfica (GIS) para o governo do Canadá. Na ocasião, Tomlinson idealizou um sistema computacional capaz de integrar dados geográficos, facilitando a análise e tomada de decisões em níveis governamentais.
Os primeiros passos
A Canada Geographic Information System (CGIS) foi uma das primeiras implementações de sucesso, estabelecendo os fundamentos para as soluções GIS que conhecemos hoje.
Em paralelo, neste mesmo período, outras instituições começaram a enxergar o potencial desta tecnologia. Durante a década de 1970, o desenvolvimento do GIS alcançou avanços mais significativos. A Universidade de Harvard lançou o Laboratório de Computação Gráfica e Análises Espaciais (LCGSA), liderando o caminho para a aplicação de computadores na análise geoespacial, fomentando o avanço técnico e metodológico das análises espaciais empreendidas com apoio computacional.
Década de 1980: a expansão do GIS
A década de 1980 testemunhou a proliferação do GIS para além das fronteiras acadêmicas e governamentais. Empresas como a Esri, fundada por Jack Dangermond, desempenharam um papel crucial na popularização da tecnologia GIS. O lançamento do software ArcInfo, em 1982, foi um marco que simplificou a manipulação de dados geográficos, tornando o GIS mais acessível aos usuários comuns.
O avanço da tecnologia ao logo dos anos 1980 permitiu aos softwares galgarem em nível de complexidade das tarefas realizadas, de modo que se tornou possível rodar sistemas GIS sem a necessidade de utilização de equipamentos robustos como os utilizados na década de 1970.
Década de 1990: o início do mundo conectado
Com a popularização da computação pessoal, a década de 1990 vivenciou uma explosão no uso de tecnologia GIS em diversos setores. A migração para ambientes digitais permitiu uma manipulação mais flexível e eficiente dos dados geográficos. Além disso, a integração com a Internet expandiu ainda mais o alcance do GIS, possibilitando o compartilhamento e a colaboração em tempo real.
Foi dentro deste contexto que em 1999 a Esri lançou o sistema ArcGIS, o qual, pela facilidade de uso e qualidade das análises, rapidamente ganhou o mercado, alcançando setores diversificados, ganhando usuários tanto nos setores governamentais, bem como na iniciativa privada.
Século XXI: o GIS ao alcance de todos
À medida que avançamos no século XXI, a tecnologia GIS se tornou uma presença onipresente em nossas vidas cotidianas. Aplicativos de mapeamento podem ser instalados em smartphones. Serviços online baseados em computação em tornaram-se ferramentas essenciais para a navegação e a tomada de decisões baseadas em localização.
Além disso, a tecnologia evoluiu para abranger temáticas envolvendo análises complexas envolvendo aplicações baseadas em inteligência artificial na interpretação de dados espaciais e sensoriamento remoto, além de incluir técnicas de modelagem tridimensional. Seja no planejamento urbano, na gestão de recursos naturais ou na resposta a desastres, o GIS desempenha um papel central na resolução de desafios complexos trazendo o conceito de inteligência geográfica ao alcance de qualquer usuário que carregue consigo um dispositivo móvel com os aplicativos instalados.
O que esperar do futuro?
À medida que olhamos para o futuro, é empolgante contemplar as possibilidades que a tecnologia GIS ainda reserva. A integração com tecnologias emergentes, como inteligência artificial e aprendizado de máquina, promete levar a análise geoespacial a novos patamares, proporcionando insights mais profundos e precisos.
A evolução da tecnologia, dos processadores e dos equipamentos certamente fará com que as análises alcancem patamares sequer sonhados por John Snow em sua análise empreendida nos meados do século XIX. A utilização de drones para coleta de dados tende a se tornar algo mais comum. Satélites terão resoluções cada vez mais superiores tanto do ponto de vista temporal, como espacial. A propagação da conectividade fará com que tenhamos a possibilidade de nos conectar em qualquer ponto do planeta, permitindo ampla disseminação de plataformas de coleta de dados. A transmissão de informações em tempo real, incluindo dados ambientais, imagens, sons e qualquer outro tipo de dado, melhorará significativamente nossa capacidade de acompanhamento e aperfeiçoamento de processos, identificando eventuais falhas antes que elas se tornem um problema.
Por fim, é importante salientar que história do GIS consiste em uma narrativa que envolve ideias disruptivas. A inovação é um conceito que acompanha esta tecnologia desde seus primórdios até o momento atual, no qual se tornou uma ferramenta essencial para a sociedade moderna. À medida que continuamos a explorar as fronteiras da informação geográfica, poderemos contemplar o papel que o GIS desempenhará nas futuras descobertas e transformações de nossa sociedade.